jun/2025

“Trilogia dos Dólares”: um marco do Faroeste Espaguete

Por André Barcinski

“Trilogia dos Dólares”: um marco do Faroeste Espaguete

Por André Barcinski

A plataforma Prime exibe “Por um Punhado de Dólares” (1964), “Por uns Dólares a Mais” (1965) e “Três Homens em Conflito” (1966), filmes dirigidos pelo italiano Sergio Leone (1929-1989) e que compõem a chamada “Trilogia dos Dólares”, um dos momentos emblemáticos do “Faroeste Espaguete”.

Nascido como uma cópia oportunista dos “westerns” de Hollywood, o gênero rendeu filmes hoje considerados clássicos de diretores como Sergio Leone, Sergio Corbucci, Damiano Damiani, Enzo Castellari e outros.

O “Faroeste Espaguete” nasceu no início dos anos 1960, depois que produtores perceberam que era possível recriar os cenários áridos do oeste americano em locações na Espanha e na Itália. Entre 1960 e 1975, mais de 600 faroestes foram produzidos em toda a Europa. Os filmes eram baratos, sempre dublados, filmados com equipes locais e elencos sem grandes estrelas. Era comum a presença de veteranos decadentes de Hollywood, como Lee Van Cleef, ou de algum ator que estivesse despontando, como um tal de Clint Eastwood.

A falta de recursos obrigava os roteiristas a usar a imaginação. Os figurantes, quase sempre mediterrâneos de pele bronzeada (como o italiano Gian-Maria Volonté, por exemplo), viravam “mexicanos”. Os diretores optavam por tramas simples e com poucos personagens.

Uma das grandes inovações do gênero foi o uso de uma trilha sonora experimental e minimalista. Sem verba para contratar orquestras, o compositor Ennio Morricone usou efeitos sonoros e até uma guitarra nas trilhas dos faroestes sangrentos e existencialistas de Leone.

Entre 1964 e 1966, Sergio Leone dirigiu três filmes na Espanha, transformando a paisagem árida da região de Almería na versão dele para o Velho Oeste dos Estados Unidos. Os filmes seriam conhecidos como “Trilogia dos Dólares”.

Os três filmes trariam como personagem principal um pistoleiro misterioso interpretado por Clint Eastwood, um nome então em baixa em Hollywood, mas que veria seu cacife comercial e sua apreciação crítica ganharem enorme impulso depois dessa trilogia.

Lançada na Itália entre 1964 e 1966, a trilogia só seria vista nos Estados Unidos em 1967, quando os filmes chegaram aos cinemas, respectivamente em janeiro, maio e dezembro daquele ano. Nos filmes, o personagem de Eastwood é chamado de “Joe”, “Manco” e “Blondie”, mas quando a trilogia foi lançada nos Estados Unidos, o distribuidor espertamente o batizou de “O Homem Sem Nome”, para dar unidade às três histórias. A tática deu certo.

No primeiro, “Por um Punhado de Dólares”, Leone copiou na maior cara de pau a história de “Yojimbo” (1961), clássico filme de samurai dirigido pelo japonês Akira Kurosawa e interpretado por Toshiro Mifune, ator predileto do cineasta. Clint Eastwood faz um caubói que chega a uma cidade disputada por dois bandos rivais e passa a trabalhar para os dois grupos, com o objetivo de eliminá-los.

O segundo filme, “Por uns Dólares a Mais”, tem Clint e o grande Lee Van Cleef como dois caçadores de recompensas que disputam o mesmo bandido, “El Indio”, vivido pelo italiano Gian Maria Volonté. Destaque no elenco para o alemão Klaus Kinski (“Fitzcarraldo”, “Aguirre, a Cólera dos Deuses”) no papel de um bandido.

O melhor dos três é, sem dúvida, “Três Homens em Conflito”, em que Clint Eastwood disputa um tesouro com dois outros mercenários sanguinolentos vividos por Lee Van Cleef (sempre ele!) e Eli Wallach. O filme traz a deslumbrante fotografia de Tonino Delli Colli e a música marcante de Ennio Morricone.

Vale muito a pena ver “A Trilogia dos Dólares”, especialmente o terceiro filme, mas é indiscutível que o maior faroeste de Sergio Leone é “Era Uma Vez no Oeste” (1968), filme que consolidou o gênero “Faroeste Espaguete” e no qual Leone teve a ousadia de colocar Henry Fonda, o herói de tantos faroestes clássicos americanos, no papel de um assassino sádico. Era a vingança do faroeste à italiana contra seu tio rico.

Um ótimo dia a todas e todos.

16 comentários em "“Trilogia dos Dólares”: um marco do Faroeste Espaguete"

  • Imagem de perfil do usuárioImagem de perfil do usuário
    Lilian Anselmo

    Fala André!

    Concordo com você nessa, e gosto muito quando vc aborda o tema faroeste aqui no Blog, seria interessante uma lista de Top 10 ou 15 dos melhores faroeste de todos os tempos na sua opinião, sua abordagem do tema é esclarecedora e simplesmente uma delícia de ler, faroeste, pra mim, é um dos melhores gêneros cinematográficos, um top 3 desse tema é parada dura e tarefa duríssima.

  • A cena inicial do Três Homens em Conflito é gag de narrativa cinematográfica muito legal. Mas a revelação do Henry Fonda como o vilão assassino de crianças em Era Uma Vez no Oeste é de arrepiar, mesmo. O roteiro desse tem a mão do Dario Argento, não? Só filmaços, inspiração para um quadrinho que lancei recentemente. Ah, e falando em Henry Fonda, dois faroestes americanos que gosto dele são Paixão dos Fortes e Consciências Mortas.

  • Imagem de perfil do usuárioImagem de perfil do usuário
    Ricardo Abeleira

    Esses filmes são um espetáculo mesmo. Também acho o Era Uma Vez o melhor dos quatro. Gosto muito também do outro Sergio, o Corbucci, que fez suas obras-primas do gênero (Django, Vingador Silencioso, Os Cruéis).
    Barcinski, você acha que a inspiração pra Um Punhado e Yojimbo foi Red Harvest, do Dashiell Hammett? A história é basicamente a mesma.

    • Imagem de perfil do usuário
      Andre Barcinski

      Cara, muita gente diz isso, mas o próprio Kurosawa nunca citou o livro, e acho que ele, que AMAVA romance policial americano, não teria por que não mencioná-lo.

  • Imagem de perfil do usuárioImagem de perfil do usuário
    Rafael Carneiro Bolda

    Quando comecei a ler a frase “O filme traz a deslumbrante…”, achei que viria “Claudia Cardinale” na próxima linha. Era uma vez no oeste é demais, valeu pelo texto.

  • Eu amo a trilogia e concordo que Era Uma Vez no Oeste é melhor que os três. Você já viu um documentário chamado “Desenterrando Sad Hill”, onde um bando de malucos cria uma campanha pra restaurar o cemitério da cena final de “Três Homens em Conflito”? Estava no Netflix até bem pouco tempo atrás, e vale a pena pra quem gosta do filme.

  • Olá André. Inicialmente tinha uma certa resistência com filmes de Faroeste/Western, acho que por desconhecimento dos filmes mesmo.
    No entanto quando comecei a ter contato com o gênero ( um amigo também me indicou), me dei conta da riqueza daquelas histórias, me parece que formadoras do cinema americano, não? Adquiri algumas caixas da Versátil e preciso, inclusive, assistir vários títulos pendentes.
    O faroeste espaguete que você citou ,apesar das limitações de orçamento entregaram obras bem interessantes, e em conjunto com a trilha sonora de Morricone acabaram de tornando puro deleite.
    Só um adendo: você acha que faroestes revisionistas cumpriram de certo modo um papel de mea culpa se levarmos em conta a maneira como a história do desbravamento do oeste foi levado às telas nos primórdios do gênero?
    Grande abraço!

    • Imagem de perfil do usuário
      Andre Barcinski

      Cara, acho que o revisionismo no western americano vem desde o fim dos anos 60 e início dos 70, com Peckinpah, “Pequeno Grande Homem”, “Butch Cassidy”, etc. Índio deixou de ser o malvadão da história há um bom tempo!

  • Fala, Barça!
    Meu pai e eu adoramos westerns, já vimos a trilogia várias vezes, mas também concordamos que nosso preferido é Era Uma Vez no Oeste.
    Aquela cena inicial na estação de trem é de colocar em toda escola de cinema!

Deixe um comentário

Ir para o topo